AFP - Agence France-Presse
Publicação: 28/11/2013 08:35
Atualização:
Uma adolescente começa a ler um poema de Rudyard
Kipling, rompendo o silêncio em uma sala cheia de idosos: "se puder
manter a calma/quando todos à tua volta já a perderam", quando um deles,
doente de Alzheimer, completa com um murmúrio: "você será um homem, meu
filho!".
Para combater a perda de memória que afeta 800 mil
pessoas no Reino Unido, instituições especializadas e hospitais estão
recorrendo à poesia.
A melodia e o ritmo de versos conhecidos
consegue bater na porta da memória, servem de "detonador que ativa" a
palavra e as lembranças, explicou Jill Fraser. A associação
Kissing it Better, que ela dirige, organiza leituras em asilos para idosos.
Quando
os pacientes "escutam uma palavra que conseguem lembrar de um poema,
eles ganham o dia", contou Elaine Gibbs, diretora do lar para idosos
Hylands, que abriga 19 velhinhos em Stratford upon Avon, terra natal de
William Shakespeare, região central da Inglaterra.
Com os cabelos grisalhos presos e vestido florido, Miriam Cowley ouve com atenção uma jovem que lê o poema
À Margarida, de William Wordsworth, um clássico nas escolas britânicas.
"Sabia
o poema, mas tinha esquecido. Aprendi quando era menina", lembrou esta
antiga professora, que sofre com a perda de memória recente. "Terei
belos sonhos, sonhos tranquilizadores, de margaridas e árvores",
comemorou.
Quando se chega a este centro, "todo mundo está
sentado em seu canto e, de repente, você começa a ler um poema em voz
alta e vê como o olhar deles se ilumina", explicou Hannah Ciotkowski,
uma voluntária de 15 anos.
"É maravilhoso quando se juntam a você
para terminar um verso", continuou Anita Wright, de 81 anos, ex-atriz
da respeitada companhia Royal Shakespeare (RSC), que também lê neste lar
e integra o projeto "Kissing it Better", que conta com voluntários de 6
a 81 anos.
O ritmo da poesia "cola no nosso eu mais profundo", assegurou Lyn Darnley, que chefia o departamento de voz e texto da RSC.
"A poesia pode afetar, recuperar lembranças, não só emoções, mas também da profundidade da linguagem", continuou Darnley.
Anita
Wright lembrou de uma experiência emocionante. Ela estava lendo um
poema sobre um homem que se despedia da amada, quando uma idosa começou a
chorar e lembrou da morte do namorado.
"Não tinha dito uma só
palavra desde que entrou na instituição e este poema abriu as comportas
porque remeteu a um episódio de sua vida", explicou Anita, emocionada.
"A
poesia não cura a senilidade", disse Dave Bell, enfermeiro da
organização Dementia UK, que luta contra o Alzheimer. "Mas tem o poder
de, como a música, devolver confiança aos pacientes: eles descobrem que
lembram de algo". Além disso, "permite criar um laço entre gerações",
acrescentou.
"Quando for velha", disse Hannah, de 15 anos, "vou
querer que as pessoas venham me ver para ler poemas e cantar músicas
para mim".
http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/viver/2013/11/28/internas_viver,476332/na-cidade-natal-de-shakespeare-poesia-vira-terapia-para-alzheimer.shtml