Sociedade
02/7/2014 - 10h29
02/7/2014 - 10h29
por Maurício Andrés Ribeiro*
A realização da Copa do Mundo de futebol no Brasil testa a capacidade do país de se organizar, oferecer mobilidade e segurança nas cidades Além disso, testa sua habilidade para receber milhares de visitantes e turistas, aloja-los, dar-lhes condições de bem estar. Os governos são cobrados em sua competência para realizar as obras necessárias a tempo e com custos adequados. A sociedade se movimenta em torno do evento: alguns exaltam seu aspecto festivo, outros criticam os gastos realizados. Ao se oferecer para sediar a Copa e ser escolhido, o Brasil se propôs um desafio que catalisou energias e recursos. Da mesma forma, uma cidade escolhida para sediar os Jogos Olímpicos induz seus governantes a saírem da gestão do dia a dia; mobiliza organização, planejamento, energias humanas e institucionais, monitoramento e fiscalização para que tudo esteja pronto a tempo para o grande evento. O desfile de escolas de samba no Rio de Janeiro, definido por Darcy Ribeiro como o maior espetáculo da Terra também demanda tal capacidade.
Organizar eventos festivos é um desafio pequeno se comparado a outros projetos coletivos. No Brasil, a construção de Brasília foi um projeto que mobilizou vontade, determinação, planejamento e capacidade de realização. Em Portugal no século XVI, as navegações foram cuidadosamente planejadas e executadas com a participação da Escola de Sagres. No século XX a descida do homem na lua foi evento que mobilizou esforço e inteligência coletiva, sob o comando da NASA.
A construção das catedrais, das pirâmides do Egito, da muralha da China mobilizaram vultosos recursos econômicos, humanos, tecnológicos e de conhecimento. Foi necessário pagar a subsistência de cada trabalhador, financiar, arrecadar e investir recursos para que elas fossem realizadas com sucesso, durante décadas ou séculos.
Dispor de um projeto, meta ou mito unificador é um requisito importante para fazer convergir as energias humanas num rumo comum. Em alguns casos, tais projetos que buscam a unificação interna são essencialmente destrutivos e voltados para a dominação de outros povos, tais como as grandes guerras. No sentido inverso apontam projetos de unificação politica, tal como o que se desenvolve na União Europeia, com todos os desafios, recuos e avanços que o caracterizam.
Para catalisar energias que levem a um futuro promissor, a humanidade pode precisar de novos projetos e obras unificadores. Um deles pode ser a construção de uma unidade politica planetária. Edgar Morin em texto intitulado O grande projeto observa que “A fecundidade histórica do Estado-Nação hoje se esgotou. Os Estados-Nação são por si mesmos monstros paranóides incontroláveis, ainda mais sob ameaças mútuas. Uma primeira superação dos Estados-Nação não pode ser obtida senão por uma confederação que respeite as autonomias, suprimindo a onipotência”. “Mas nós ainda estamos na “idade do ferro planetário”: ainda que solidários, continuamos inimigos uns dos outros e a explosão dos ódios de raça, de religião, de ideologia, provoca sempre guerras, massacres, torturas, ódio e desprezo”. Um projeto político ainda por se realizar é a constituição de uma Federação Planetária que suceda a atual fase dos estados –nação e que avance em relação à Organização das Nações Unidas, da mesma forma como essa avançou em relação à Liga das Nações.
Um projeto unificador é necessário para lidar com a crise ecológica e climática planetária. Thomas Berry e Brian Swimme propõem uma obra coletiva de transitar dessa crise para uma era em que exercitemos nossa capacidade de sustentar o mundo natural para que o mundo natural possa nos sustentar, num processo de sustentabilidade recíproca. Eles observam que “Todos nós temos nosso trabalho particular. Temos uma variedade de ocupações. Mas além do trabalho que desempenhamos e da vida que levamos, temos uma Grande Obra na qual todos estamos envolvidos e ninguém está isento: é a obra de deixar uma era cenozóica terminal e ingressar na nova Era Ecozóica na história do Planeta Terra. Esta é a Grande Obra”. Eles observam que “Precisamos reinventar o humano no nível da espécie porque os temas com que estamos envolvidos parecem estar além da competência de nossas tradições culturais atuais, seja individualmente ou coletivamente”.
A crise climática está associada a uma crise da evolução biológica e cultural. Diante da perspectiva de colapso planetário e da percepção dos limites da capacidade de suporte do planeta, a busca da segurança motiva uma construção coletiva de respostas. Um dos mitos unificadores atuais é o da sustentabilidade, que se procura viabilizar por meio de um conjunto de iniciativas que envolvem governos, empresas, organizações sociais e indivíduos. Imaginar um projeto unificador, ter a determinação e mobilizar os recursos para colocá-lo em prática numa obra coletiva é um pré-requisito para se construir um futuro promissor.
* Maurício Andrés Ribeiro é autor de Ecologizar e de Meio Ambiente & Evolução Humana WWW.ecologizar.com.br ecologizar@gmail.com
(O Autor)
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